Brasília - A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)
divulgou esta semana estudo mostrando que o uso do metilfenidato,
medicamento usado no tratamento do Transtorno do Déficit de Atenção com
Hiperatividade (TDAH), aumentou 75% entre crianças e adolescentes com
idade de 6 e 16 anos de 2009 a 2011. Ampliando a faixa etária entre 6 e
59 anos, houve um aumento de 27,4% no mesmo período.
Apesar disso, de acordo com o psiquiatra da infância e adolescência
Guilherme Polanczyk, membro da Associação Brasileira de Déficit de
Atenção (Abda), mesmo com o aumento, o consumo do medicamento é
insuficiente para suprir as necessidades das crianças que têm esse
transtorno no país.
O estudo cita que no primeiro semestre de 2011 houve um consumo
médio do metilfenidato entre crianças e adolescentes no Brasil de 19,7
caixas para cada mil crianças. “Por meio de estudos que avaliam o número
de crianças que têm a doença no Brasil e considerando que todas as
caixas vão para pessoas com TDAH, não mais do que 20% das pessoas
estariam recebendo tratamento”, diz Polanczyk. O especialista diz que o
medicamento também é usado para outros tratamentos, como depressões mais
graves, mas em baixa proporção.
Segundo Polanczyk, que também é professor de psiquiatria da infância
e adolescência da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo,
estima-se que no Brasil cerca de 5% das crianças e adolescentes sofrem
de TDAH e o aumento do consumo do metilfenidato mostra um “maior
reconhecimento e diagnóstico da doença”. Segundo informou a Anvisa, o
TDAH afeta de 8% a 12% das crianças no mundo.
O metilfenidato é um medicamento de tarja preta, ou seja, só pode
ser comprado com receita médica. A tarja traz o alerta de que o
medicamento pode causar dependência física ou psíquica. Segundo o
levantamento da Anvisa, entre os prescritores do medicamento, há um
predomínio de médicos que se dedicam à assistência à criança e ao
adolescente e dos que tratam de distúrbios estruturais do sistema
nervoso.
De acordo com a Anvisa, o TDAH é um dos transtornos neurológicos do
comportamento mais comuns da infância. Segundo Polanczyk, o TDAH é um
transtorno com inicio na infância e que uma boa proporção das pessoas
tem uma melhora dos sintomas quando entram na vida adulta, mas alguns
permanecem com dificuldades. Entre os adultos cerca de 3% têm TDAH.
João* mora em Brasília, tem 36 anos e recebeu o diagnóstico de que
tem TDAH há um ano. “Eu não conseguia ler um livro, nem sobre assuntos
pelos quais me interessava. Lia até a quarta página e depois tinha que
voltar porque não havia compreendido. Por algumas vezes atravessei rua
lendo mensagem no celular totalmente distraído”, diz. Ele toma
metilfenidato desde maio de 2012 e percebeu o impacto do remédio na sua
vida desde o início. “Agora eu consigo ler um livro normalmente”.
João diz que foram feitos vários testes e exames para saber se ele
teria alguma contraindicação com relação ao remédio. “Comecei tomando 5
mg [miligramas], hoje tomo 30 mg por dia e me sinto bem”.
No Distrito Federal, onde foram comercializados em 2011 mais de 114
caixas do medicamento para cada mil crianças, foi registrado o maior
consumo de metilfenidato no triênio estudado pela agência. Para a
coordenadora do Sistema Nacional de Gerenciamento de Produtos
Controlados (SNGPC) da Anvisa, Márcia Gonçalves, o estudo feito
contribui para identificar possíveis sinais de distorção de uso dos
produtos e no trabalho em estratégias e enfrentamento do problema.
Dificuldade de prestar atenção, controlar comportamentos impulsivos
e, em alguns casos, hiperatividade são alguns dos sintomas de quem tem
TDAH. Para a Anvisa, o diagnóstico do TDAH é complicado pela ocorrência
de comorbidades (ocorrência simultânea de dois ou mais problemas de
saúde em um mesmo indivíduo), como dificuldades de aprendizagem,
transtornos de conduta e de ansiedade, e depende fortemente de relatos
dos pais e professores para ser identificado. Nenhum exame laboratorial
confiável faz o diagnóstico desse transtorno.
"É uma doença tratável, a medicina oferece intervenções que melhoram
os sintomas e que ajudam bastante no desenvolvimento. Muitas pessoas
passam a ser adultos sem TDAH ou com sintomas bem mais leves", disse
Polanczyk.
*Foi usado um nome fictício a pedido do entrevistado
Por Aline Leal
Repórter da Agência Brasil
Repórter da Agência Brasil
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