Nas próximas horas, uma batalha decisiva pelos seus direitos na
internet será travada no Congresso Nacional. O Marco Civil da Internet
(PL 2126/2011) será votado de forma pioneira no Brasil, definindo as
regras de um jogo que está sendo debatido e disputado em todo o mundo.
De onde veio isso?
Esse não é um projeto só do governo brasileiro, ele foi construído
coletivamente definindo direitos e deveres dos cidadãos e empresas na
internet. O enorme esforço de diversos setores da sociedade deu forma ao
projeto com o maior consenso possível para a garantia dos principais
direitos civis na internet.
1 - LIBERDADE DE EXPRESSÃO
O que acontece hoje?
Hoje, o que você escreve na rede pode ser eliminado sem qualquer
chance de defesa. A velha e boa censura, que aterrorizou o país durante a
ditadura militar, é uma prática corrente na internet, com a diferença
que não é mais necessário um órgão especializado do Estado autoritário
para se retirar textos, imagens, vídeos e qualquer tipo de conteúdo do
ar. Basta um telefonema, ou um email de quem não queira ver o conteúdo
divulgado. A falta de leis que se refiram à internet cria uma
insegurança jurídica para os sites que hospedam os conteúdos e, com o
receio de serem responsabilizados pelo que foi publicado pelos seus
clientes como se fossem eles mesmos os responsáveis, simplesmente
retiram o conteúdo do ar. Isso faz, por exemplo, com que prefeitos que
não gostam de críticas ameacem processar por difamação um provedor que
hospeda um blog. Ou que corporações da indústria cultural notifiquem o youtube para retirada de conteúdos que utilizem obras protegidas por direito autoral.
E eu com isso?
Você pode pensar: “Mas é justo que sejam punidos difamadores ou quem o
usa indevidamente obras protegidas de propriedade intelectual privada”.
Talvez, mas a pergunta é: “Quem decide isso?” Quem disse que o uso era
realmente indevido? Quem disse quer se tratava de difamação, e não
apenas de uma crítica ou denúncia? Essa decisão não pode ser tomada
unilateralmente nem pelo denunciante, nem pelo denunciado. Por isso, as
democracias modernas inventaram um sistema para tentar resolver essa
questão que se chama sistema judiciário, colocando a responsabilidade da
decisão na mão de um juiz. Como não há lei na internet, políticos e
corporações se valem do risco econômico que os sites estão sujeitos e,
com simples notificações, criem uma indústria de censura automática na
rede, sem respeitar qualquer processo legal, ou dar o direito de defesa a
quem produziu e divulgou os conteúdos questionados. Você perde
liberdade para se expressar na rede e de se informar pelo que foi
censurado!
E o que muda com a aprovação do Marco Civil da Internet?
O artigo 20 do Projeto de lei 2126/2011 retira a responsabilidade dos
sites sobre os conteúdos gerados por terceiros, acabando com a
insegurança jurídica e com a desculpa utilizada para a censura
automática.
E quem joga contra?
A pressão da Rede Globo conseguiu criar no Marco Civil uma exceção
para esta regra, ao definir que, para conteúdos com direito autoral,
serão tratados especificamente na Lei de Direito Autoral, o que mantém a
situação atual para esses tipos de conteúdo até que a lei seja
reformada. Com isso, a Globo seguirá censurando o debate acerca de sua
obra na internet, mas os outros tipos de conteúdos passam a ter uma
garantia legal contra a censura automática.
2 – PRIVACIDADE
O que acontece hoje?
A privacidade se transformou, literalmente, em uma mercadoria na
internet. Geralmente, nos diversos serviços gratuitos que podem ser
utilizados na rede, o produto a ser comercializado é o próprio
internauta na forma dos seus dados mais íntimos. Plataformas como Google
e Facebook utilizam suas informações pessoais, os dados gerados pelo
seu comportamento, tais como buscas, avaliações positivas e negativas de
conteúdos existentes e o próprio conteúdo da sua comunicação para
vender para empresas interessadas no seu padrão de consumo, ou mesmo
para fornecer a governos que estejam monitorando a movimentação política
de seu país ou de outros. O ex-agente da NSA, Edward Snowden, revelou
ao mundo que a agência de espionagem estadunidense monitorava a
comunicação privada de cidadãos de forma massiva e não apenas em
investigações pontuais. Snowden também revelou que a espionagem contava
com a colaboração de empresas de tecnologia e infraestrutura.
E eu com isso?
A lógica da privacidade como mercadoria compromete a própria
liberdade de expressão. Sem regras de proteção da privacidade, estamos
vulneráveis ao humor de um Estado autoritário, vigilante e aos
interesses privados das empresas. Quanto vale o acesso aos dados dos
seus exames médicos? E do seu histórico contábil? Suas preferências
políticas, sexuais e culturais?
E o que muda com a aprovação do Marco Civil da Internet?
O Marco Civil estabelece uma série de proteções a nossa privacidade
na internet. O artigo 7 define que as fotos e textos que você excluiu
há muito tempo do Orkut e que pensa terem sido apagados com a sua saída
desta rede social, finalmente terão que ser efetivamente excluídos com a
aprovação da lei. O marco civil não impede a espionagem americana, mas
coloca na ilegalidade a cooperação entre empresas e governos no
monitoramento massivo. A lei também não impedirá Google e Facebook de
venderem nossas informações, mas define que isso deve ser autorizado de
forma livre, expressa e informada. Isso sim impede que as empresas de
telecomunicação guardem os dados de tudo o que fazemos na rede.
E quem joga contra?
As bancadas policialescas do Congresso Nacional conseguiram a
inclusão do artigo 16 ao projeto. Este artigo define o armazenamento
obrigatório de tudo que se fizer em determinados sites para fins de
investigação policial. Esta inclusão vai de encontro a todo espírito de
proteção da privacidade ao estabelecer a vigilância em massa. Inverte o
preceito constitucional da presunção de inocência, onde todos passam a
ser considerados culpados até provem o contrário.
3 - NEUTRALIDADE DE REDE
O que acontece hoje?
Este é o ponto de maior polêmica entre sociedade civil e empresas de
telecomunicações. Com a aprovação da neutralidade de rede como um
princípio, as empresas donas dos cabos por onde trafegam os pacotes de
dados ficam impedidas de favorecer esse ou aquele serviço, esse ou
aquele produto no tráfego. Basicamente, todo conteúdo deve trafegar da
mesma forma, com a mesma qualidade. Essa definição é importantíssima
para garantir que a internet se mantenha como um meio democrático, onde
todos têm as mesmas condições de falar e ganhar repercussão. Ter uma
rede neutra é definir que o dono da estrada não pode definir que
veículos podem andar mais rápidos e quais tem que enfrentar um
congestionamento. Se nossas estradas não fossem neutras em relação a
quem viaja por elas, existiriam uma larga pista para quem pagasse mais e
um pista estrita para quem não tivesse dinheiro. Ou ainda a
administradora da estrada poderia definir, em um acordo comercial com
montadoras, que algumas marcas de automóveis passam sem pagar pedágio,
enquanto as outras são obrigadas a pagar. Como não existem leis
obrigando a neutralidade na rede de internet, hoje as estradas digitais
são administradas de forma assimétrica por quem controla os cabos.
E eu com isso?
Sem uma rede neutra, você não tem como saber se o serviço que usa
está ruim por um motivo técnico, ou por um acordo comercial que você
desconhece. Você não tem como saber se o serviço de voz do Skype está
ruim por que a Microsoft (dona do Skype) não paga a NET para passar os
seus produtos pela rede. Sem neutralidade, a internet pode ser vendida
como uma TV a cabo e você perde dos dois lados. O seu site não será tão
visto na internet quanto o de uma corporação transnacional que poderá
pagar por isso. Além disso, você não encontrará os conteúdos pelos quais
não puder pagar. Perde-se dos dois lados e quem controla a
infraestrutura ganha dos dois lados.
E o que muda com a aprovação do Marco Civil da Internet?
O artigo 9 no marco civil diz, claramente, que a empresa de
infraestrutura deverá “tratar de forma isonômica quaisquer pacotes de
dados, sem distinção por conteúdo, origem e destino, serviço, terminal
ou aplicação”. Ou seja, deve ser neutra em relação ao que passa nos seus
cabos vendendo apenas capacidade de tráfego sem interferir no tráfego
em si.
E quem joga contra?
As empresas de telecomunicação, mais conhecidas como
Vivo/Telefônica, Claro/Embratel, TIM e Oi, são as principais opositoras,
pois querem poder negociar de todos os lados do balcão e impor
condições assimétricas para o consumidor. Essas empresas depositam no
deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) suas esperanças de obstruir o projeto
de lei que as obriga respeitar direitos civis na rede.
O QUE PODE SER FEITO?
Para fortalecer a luta em defesa de um Marco Civil da Internet, que
seja capaz de estabelecer, democraticamente, princípios, direitos e
deveres para o uso da Internet, ativistas e organizações da sociedade
civil organizaram uma agenda intensa de mobilizações para os próximos
dias:
Assine a petição on line: http://www.avaaz.org/po/o_fim_da_internet_livre_gg/?mmc
Abaixo Entrevista com o Analista Político Paulo Vannuchi ao Rede Brasil Atual:
Por Coletivo Intervozes, Carta Capital e Rede Brasil Atual
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